Os Naturais e o Princípio da Boa Ordenação
Matemática

Os Naturais e o Princípio da Boa Ordenação


  Autor: Blog Fatos Matemáticos - Profº Paulo Sergio    
 
    Enquanto a geometria, [;300;] anos antes de Cristo, nos Elementos de Euclides, já recebia um tratamento lógico-dedutivo, com seus postulados e axiomas, definições e teoremas, para a teoria dos números e mesmo para outras partes da Matemática, demorou muito a receber um tratamento semelhante.

       A primeira tentativa nesse sentido se deve a Giovanni Campano que viveu por volta de [;1260;]. Este capelão do Papa Urbano [;IV;]procurou fundamentar os números naturais em [;4;] postulados, o último dos quais afirmava que "um número não pode diminuir indefinidamente", o que significa, no fundo, a existência do mínimo de qualquer coleção de número naturais. Gottfried W. Leibniz [;(1646-1716);] assinalou que "verdades" tão evidentes como [;2 + 2 = 4;] devem ser objeto de demonstração a partir do conceito de número, o mesmo devendo acontecer também com propriedades aparentemente tão óbvias como a comutativa da adição e a comutativa da multiplicação. Mas Leibniz não se aprofundou no assunto.

       Mas ao se chegar ao século [;XIX;] já não era possível à Matemática, no estágio que atingira e no ritmo em que se desenvolvia, continuar se apoiando quase que inteiramente na intuição. Desse modo, seus alicerces passaram a ser investigados amplamente e a receber a fundamentação lógica necessária.

       No que se refere aos números, parece que a primeira tentativa séria nesse sentido foi feita por Hermann G. Grassmann [;(1809-1877);] que, em [;1861;], definiu adição e multiplicação de inteiros e demontrou as propriedades fundamentais dessas operações, usando apenas a função sucessor [;x \to x+1;] e implicitamente o princípio de indução. O primeiro sistema completo de axiomas para a aritmética foi apresentado por Richard Dedekind [;(1831-1916);] em [;1888;] e em [;1891;] o matemático italiano Giuseppe Peano [;(1858-1932);] apresenta a sua axiomatização dos números naturais.

       Para finalizar vejamos um axioma importante usado para demonstrar o Princípio da Indução Finita, muito usado para provar várias propriedades referentes aos números inteiros.

Axioma (Princípio da Boa Ordenação): Todo subconjunto não vazio [;A;] de inteiros não negativos possui um elemento mínimo, isto é, existe [;n_0 \in A;] tal que [;n_0 \leq n;], para todo [;n \in A;].

Teorema (Princípio da Indução Finita): Seja [;N = \{n_0,n_1,n_2,\ldots\} \subset \mathcal{N};]um conjunto de inteiros não negativos. Suponhamos que [;n_0 \prec n_1 \prec n_2 \prec \ldots;] e seja [;S(n);] uma proposição que depende de [;n \in N;], tal que:

a) [;S(n_0);] é verdadeira;

b) Se [;m \in N;] e [;S(n);] é verdadeira para todo [;n \in N;] tal que [;n \prec m;], então [;S(m);] é verdadeira.

Então [;S(n);] é verdadeira para qualquer [;n \in N;].

Demonstração:
A prova será feita por contradição. 

Seja
[;F = \{l \in N : S(l);] não é verdadeira[;\};]
e suponha por absurdo que [;F \neq \empty;]. Pelo Princípio da boa ordenação existe [;l_0 \in F;], [;l_0 \succ n_0;], (já que [;S(n_0);] é verdadeira), tal que [;l_0 \leq l;] para todo [;l \in F;], isto é [;l_0;] é um elemento mínimo de [;F;]. Deste modo, [;S(n);] é verdadeira para todo [;n \in N;], tal que [;n \prec l_0;] (a não validade desta afirmação comprometeria a minimalidade de l_0). Pela hipótese [;(b);] temos que [;S(l_0);] é verdadeira, uma contradição. Assim, devemos ter [;F = \empty;] e [;S(n);] verdadeira para todo [;n \in N;].

Referências Bibliográficas:

-H. Domingues, Hygino. Fundamentos de Aritmética. Atual Ed. Ltda, São Paulo, [;1991;].
-Shokranian, Salahoddin et. alli. Teoria dos Números. Ed. Universidade de Brasília, [;2^{\underline{a}};] ed., Brasília, [;1999;].




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