Matemática
Por que podemos somar os algarismos de um número para saber se ele é divisível por 3?
Todos conhecemos, desde muito cedo, um critério de divisibilidade por 3, afinal, quem é que quando precisou dividir um número por três nunca somou os seus algarismos?
O que, talvez, nem todos sabemos é explicar porque este procedimento sempre funciona. Esta postagem se dedica, portanto, a demostrar que este fato é verdadeiro.
Esclarecendo melhor o que é um critério de divisibilidade: é uma regra que nos permite saber se um determinado número inteiro x é divisível por um outro número inteiro k, mas de uma maneira mais fácil do que efetuando a divisão.
No caso de ser k = 3 o teste (ou critério) se baseia em somar os algarismos que formam o número x. Se esta soma for divisível por 3 então o número x também é divisível por 3.
Exemplificando: para saber se o número 259 é divisível por três não precisamos efetuar a divisão até o fim e verificar se o resto é zero. Basta calcularmos 2+5+9. Neste caso a soma é 16. Como 16 não é divisível por 3 podemos afirmar que 259 não é divisível por 3. De fato, se fizermos a conta vamos obter resto 1. Já com relação ao número 552 podemos afirmar com toda certeza que é divisível por 3, pois 5+5+2 = 12 e sabemos que 12 é divisível por 3 (pois tem 12 na tabuada do 3).
Mas como demonstrar que isso sempre vale? Isto é o que veremos nesta postagem, começando por uma definição e um teorema (de demonstração bem fácil):
Definição: Diz-se que o inteiro d divide o inteiro a (ou que que a é divisível por d) se existe um inteiro a' tal que a = da'.
Teorema: Se d divide a e também divide b, então d divide a soma (am + bn), onde m e n são dois números inteiros quaisquer.
Prova: Vamos supor que d divide tanto a quanto b. Como d divide a e b podemos afirmar (em virtude da definição) que existem inteiros a' e b' tais que:
a = da'
b = db'
Multiplicando a primeira das igualdades acima por m e a segunda delas por n obtemos:
am = da'm
bn = db'n
Somando, membro a membro, as duas últimas igualdades vem:
(am + bn) = (da'm + db'n)
Colocando o d em evidência:
(am + bn) = d(a'm + b'n)
Uma vez que tanto a multiplicação quanto a adição entre números inteiros resulta em um número inteiro, podemos afirmar que, na última expressão, em cada lado da igualdade, o que está entre parenteses representa um número inteiro. Colocando, então, (am + bn) = t e (a'm + b'n) = t' (onde t e t' são inteiros) obtemos
t = dt'
Segue da igualdade acima (vide definição) que d divide t. ou, em outros termos, que d divide (am + bn) e é isto o que queríamos provar.
Vamos agora aplicar este teorema para demonstrar o critério de dividibilidade por 3, começando com um número de apenas dois dígitos: xy.
Observação: xy não representa o produto de x por y. Um produto será representado pelo ponto: x?y. O termo xy representa qualquer número de dois dígitos, tais como 12 (doze), 37 (trinta e sete), 48 (quarenta e oito), etc. Então y é o algarismo das unidades e x é o algarismo das centenas.
Vamos supor que xy é divisível por três. Observe o seguinte:
xy = 10?x + yxy = (9 + 1)?x + yxy = 9?x + x + yxy = 9?x + (x + y)9?x + (x + y) = xy(x + y) = xy - 9?x(x + y) = xy + (-9?x)
Note que 3 divide xy (pois, por hipótese, xy é divisível por 3) e, além disso, 3 divide (-9?x) (pois (-9?x) = 3?(-3?x)), logo (em virtude do teorema) a soma xy + (-9?x) também é divisível por 3. Mas xy + (-9?x) é igual a (x + y), do que resulta que (x + y) é divisível por 3.
Conclusão 1: se o número xy é divisível por 3, então (x + y) também é. Em palavras: se um número de dois algarismos é divisível por 3, então a soma de seus algarismos também é divisível por 3.
Supõe agora que (x + y) é divisível por 3. Como já vimos, 3 divide (-9?x) e, portanto, (novamente em virtude do teorema) 3 divide a soma 9?x + (x + y). Mas também já vimos que xy = 9?x + (x + y), donde segue que 3 divide xy.
Conclusão 2: se (x + y) é divisível por 3, então o número xy também é. Em palavras: se a soma de dois algarismos é divisível por 3, então o número de dois dígitos formado por estes algarismos também é divisível por 3.
Acabamos de considerar o caso em que os números tem dois dígitos, mas e nos outros casos? Como fica a validade do critério para números maiores? Bom, exatamente o mesmo raciocínio pode ser empregado. Vejamos o caso para números de três dígitos:
Desta vez x representa o algarismo das centenas, o y o algarismo das dezenas e z o das unidades (tais como 300, 547, 258, etc.).
Com um desenvolvimento semelhante ao anterior:
xyz = 100?x + 10?y + z
xyz = (99 + 1)?x + (9 + 1)?y + z
xyz = 99?x + x + 9?y + y + z
xyz = 99?x + 9?y + x + y + z
xyz = (99?x + 9?y) + (x + y + z)
xyz = 9?(11?x + y) + (x + y + z)
A partir deste ponto podemos argumentar de modo semelhante ao que foi feito no caso de dois dígitos e tirar as mesmas conclusões. Se aumentarmos a quantidade de algarismos do número, as últimas linhas do desenvolvimento serão:
xyzw = 9?(111?x + 11?y + w) + (x + y + z + w)
xyzwp = 9?(1111?x + 111?y + 11?w + p) + (x + y + z + w + p)
xyzwpq = 9?(11111?x + 1111?y + 111?w + 11?p + q) + (x + y + z + w + p + q)
E assim por diante.
Com um pensamento idêntico (exceto pelo fato de haver, em cada caso, um número a mais dentro de cada parenteses) as conclusões 1 e 2 serão as mesmas (para qualquer que seja o tamanho do número), ou seja, vamos concluir que:
1) se um número é divisível por 3 então a soma de seus algarismos também é divisível por 3;
2) se a soma dos algarismos de um número é divisível por 3, então o número formado por estes algarismos também é divisível por 3.
Está, pois, demonstrado o critério. Em virtude de 2, jamais vamos encontrar um número não divisível por 3 cuja soma dos algarismos seja divisível por 3 e, em virtude de 1, jamais vamos encontrar um número divisível por três cuja soma não seja.
Há, contudo, outra maneira de demonstrar o mesmo critério e que brevemente abordaremos aqui no BLOG MANTHANO (fazendo uso do conceito de congruência entre números inteiros).
Referência: Introdução à Teoria dos Números de José Plínio Santos; Criptografia de S. C. Coutinho.Erros podem ser relatados aqui.
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