Educação é Mercadoria?
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Educação é Mercadoria?



Ouve-se muito expressões como "educação não é mercadoria", "educação não é produto a ser comercializado", entre outras semelhantes. A própria União Nacional dos Estudantes (UNE) lançou recentemente uma cartilha intitulada Educação Não É Mercadoria, na qual são denunciados supostos abusos de empresários da educação. Além disso, na tal cartilha se defende uma legislação que regulamente a automática fusão e transferência de instituições de ensino descredenciadas pelo Ministério da Educação (MEC). É claro que a lógica por trás desse tipo de movimento é a de que os cofres públicos são inesgotáveis. Mas não quero discutir sobre isso nesta postagem. Afinal, é preciso avaliar uma visão ingênua por vez.

O objetivo aqui é levantar apenas uma questão: educação é mercadoria?

Como não tenho competência jurídica ou econômica para responder a esta questão, apelarei para uma visão usual (apesar de nem sempre praticável, por conta das inconsistentes arbitrariedades de autoridades econômicas e jurídicas) sobre o conceito de mercadoria. Mercadoria é "todo o bem sujeito a mercancia, ou ainda, toda coisa móvel, apropriável, que possa ser objeto de comércio".

Assim como existem o comércio formal (tributado) e o comércio informal (que sonega impostos), também existem a educação formal e a educação informal. A educação formal é aquela educação institucionalizada e legalmente regulamentada, na qual o processo educacional é reconhecido pela emissão de históricos escolares, certificados e diplomas, nos termos de leis. Já a educação informal é um processo social inevitável, por consequência de interações sociais de indivíduos com a unidade familiar, círculos sociais e ambiente. É a velha máxima que diz "O que não se aprende em casa, se aprende na rua." Neste contexto, autodidatismo também é uma manifestação de educação informal.

No processo social de educação formal há a oferta de conhecimentos gerais e específicos, sejam científicos, tecnológicos, culturais, morais, históricos ou artísticos. E esta oferta de conhecimentos jamais é gratuita, em termos econômicos. Ela é paga, no caso de instituições privadas, e paga através de impostos, no caso de instituições públicas que não cobram mensalidades ou anuidades. 

O bem adquirido por aquele que foi beneficiado com educação formal é conhecimento. Este mesmo conhecimento é um bem apropriado pelo beneficiado e que pode ser vendido. Com efeito, é por conta deste conhecimento que o beneficiado pode criar e desenvolver uma carreira profissional, que permita a sua inserção no complexo mercado de trabalho. E, assim como dinheiro investido pode produzir mais dinheiro, conhecimento investido também pode produzir mais conhecimento e, portanto, dinheiro. É o que ocorre nos processos de inovação, seja científica ou tecnológica.

Portanto, a educação formal oferta conhecimentos que são, de fato, objetos de comércio. Conhecimento é objeto de compra e venda.

O profissional que evidencia de forma mais clara o fato de educação ser mercadoria, é justamente o professor. É um indivíduo que sistematicamente professa conhecimentos em troca de um salário.

No entanto, vale uma ressalva extremamente importante. No comércio de bens e serviços existe a frequente preocupação sobre a qualidade daquilo que é vendido e comprado. Avaliar a qualidade de uma fruta ou de um automóvel é uma tarefa muito menos complexa do que avaliar a qualidade da educação ofertada por uma instituição de ensino e, consequentemente, pelos seus professores.

Vários questionamentos sobre a qualidade da educação em nosso país já foram apresentados, discutindo-se desde a grave crise na USP (que muitos ingenuamente atrelam a aspectos meramente financeiros), até a qualidade de cursos de direito, passando pela desvalorização de jovens talentosos e pelo paradoxal não reconhecimento de professores premiados, apenas para citar alguns exemplos.

Portanto, o discurso de que educação não é mercadoria precisa ser revisado de forma menos ideológica (como se percebe em movimentos estudantis e movimentos de greve de professores) e mais pragmática. 

O que define o sucesso de vendas de uma mercadoria é o mérito conquistado por quem produziu e quem distribuiu e comercializou tal mercadoria. Como o Brasil é um país sem tradição alguma na produção de conhecimentos, a função principal de suas instituições de ensino tem sido a mera distribuição e comercialização de tais conhecimentos. Talvez por isso mesmo se insiste tanto nos impensados jargões "educação não é mercadoria" e "educação não é produto a ser comercializado". Isso porque falta aos educadores deste país a visão sobre o que, afinal, é educação e até mesmo sobre o que é comércio. 

O fato de existirem exemplos de brasileiros que produziram conhecimentos não se reflete ainda em qualquer tradição de produção de conhecimentos. Falta massa crítica para exercer influência definitiva na cultura brasileira como um todo. 

E como a educação brasileira não está concatenada com qualquer tradição de produção de conhecimentos, isso acaba comprometendo a distribuição de conhecimentos. Tanto é verdade que professores em nosso país apenas repetem palavras escritas em livros ou apostilas, sem permitir espaço para questionamentos. Quem distribui e comercializa sem conhecer o seu produto, está inevitavelmente fadado ao fracasso. 

Apenas uma última mensagem ao leitor, no que se refere ao tema desta postagem: sempre desconfie da opinião da maioria.

Quem produz conhecimento sabe que todo conhecimento é questionável. Se alguém discursa algo como "educação não é mercadoria" sem justificar, provavelmente não tem a mais remota ideia sobre o que está falando. Portanto, desconfie. Avalie. Questione. Esta é uma forma de colaborar com a inversão cultural de nosso país e, talvez, desenvolver alguma tradição na produção de ideias. Assim, quem sabe, um dia teremos um Brasil genuinamente dedicado à educação, sem discursos demagógicos e precipitados.




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