Joan Baez no Brasil: antecipação de cena?
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Joan Baez no Brasil: antecipação de cena?



Meu filho acaba de voltar de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. O motivo de sua viagem foi um show de Joan Baez, que ocorreu ontem à noite no Auditório Araújo Vianna.

Joan Baez é uma cantora folk norte-americana, ícone do festival de Woodstock e conhecida pela natureza de protesto político-social em suas canções e até mesmo fora dos palcos. Foi presa duas vezes em manifestações públicas de protesto.

É a primeira vez, ao longo de cinquenta e quatro anos de carreira, que Baez faz um show em nosso país. Mas isso não é resultado de descuido dela. Em 1981, Baez tentou vir para cá. No entanto, foi proibida pela Ditadura Militar de pisar em solo brasileiro.

Baez não surpreendeu apenas pelo absoluto domínio sobre a plateia de quase três mil pessoas e pela assombrosa suavidade de sua voz e impecável técnica de canto. Em show realizado na capital do estado de origem de três dos cinco militares que governaram o Brasil na época da ditadura, Baez revelou que está estudando português. Não apenas conversou com o público em nosso idioma, como também cantou Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores, de Geraldo Vandré, e Cálice, de Chico Buarque. 

A reação do público foi intensa. Pessoas erguiam o punho, ao som da música de Vandré, revivendo um passado de cinquenta anos que hoje parece se repetir.

Um processo de doutrinação (pseudo) marxista está infestando escolas da rede pública em diferentes estados da União. O governo federal apoia ditaduras espalhadas mundo afora, incluindo a de nossos vizinhos venezuelanos. O povo brasileiro é um dos mais boçais do mundo, usando confortos tecnológicos criados e produzidos por outros, mas sem assimilar valores sociais e culturais que edifiquem a nossa nação. Educação, segurança, justiça e saúde operam de forma precária na maior parte do país que tentará expor uma imagem bonita na Copa do Mundo (e, quem sabe, nas Olimpíadas de 2016!). A Agência Brasileira de Inteligência já identificou possíveis grupos organizados que podem até mesmo impedir a Copa do Mundo. No entanto, em usual demonstração de incompetência, afirma ser impossível antecipar a ação dos chamados "lobos solitários". 

Os problemas sociais em nosso país iniciam em seus fundamentos. E nem precisamos procurar evidências disso em fontes típicas de denúncias sociais. Vejam, por exemplo, este anúncio de um novo modelo de notebook da Sony. O texto diz:

"Executivos e Profissionais Criativos: Designers, arquitetos, profissionais de marketing e músicos vão se impressionar com a performance dos processadores Intel de quarta geração [...]

Universitários: Poderão utilizar a caneta digital para fazer anotações e poderão se divertir com a tela compartilhada para conversar com os amigos e assistir vídeos [...]"

Isso demonstra a perfeita sintonia entre agentes de publicidade que trabalham para a Sony e a realidade da vida acadêmica brasileira. Universitários são indivíduos que se divertem conversando com amigos e assistindo vídeos. Eventualmente fazem anotações.

Quando ingressei, em 1983, no Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do Paraná (UFPR), ganhei uma calculadora TI55-II (Texas Instruments). Ela era programável, aceitando uma entrada de até 55 bytes! Não estou falando de 55 kbytes, megabytes ou gigabytes. Estou falando de 55 bytes! No manual da calculadora nem se usava a expressão "byte". O termo empregado era "passo de programação". A TI55-II tinha 55 passos de programação. E com esses 55 passos de programação eu programava operações de limites, derivadas e até integrais definidas. Mais tarde, durante o mestrado, comprei uma calculadora Cassio, na qual era possível inserir programas de 422 bytes. Achei aquilo uma maravilha. Eu já era capaz de programar integração numérica usando o método de Runge-Kutta. Cheguei a criar uma simulação de órbita de uma partícula eletricamente carregada ao redor de uma esfera com carga oposta, sujeita a um potencial de Debye. Isso tudo com 422 passos de programação!

Hoje os universitários têm acesso a máquinas com poder de memória e processamento extraordinariamente superiores às máquinas que usávamos nos anos 1980. E de que forma essas máquinas são usadas? Para ver vídeos, conversar com amigos e fazer anotações! Nos anos 1980 a publicidade de calculadoras científicas enfatizava o emprego dessas máquinas como instrumentos para tomada de decisões. Hoje a função anunciada é outra, principalmente quando o público-alvo é o de estudantes universitários.

Em resumo, Joan Baez veio ao Brasil na hora certa. E os poucos milhares que poderão testemunhar seus próximos shows no país poderão sentir aquela combinação de paixão e revolta que anuncia um estado de revolução.

Em um país fundamentalmente errado como o nosso, de fato há apenas uma solução: revolução.

Como já disse Geraldo Vandré em passado não muito distante, "protesto é coisa de quem não tem poder". E a forma mais eficaz de protesto é a revolução. Sem revolução, o Brasil manterá sua atual inércia até o momento em que mudanças não serão mais possíveis. Ainda somos um país rico em termos materiais. Ainda existem brasileiros que decidiram ficar no país e contribuir com a sua construção científica, tecnológica, social e cultural. Mas ainda falta a esses brasileiros a articulação política que simplesmente diga: Basta!

A hora é agora.




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