Tal fato é fácil de verificar, e portanto o deixamos ao leitor (Ver Exercício 1).
Exemplo 2 - O espaço l²(N) das sequências de números complexos
É um espaço de Hilbert com o produto interno
(Ver Exercício 2)
Exemplo 3 - O Espaço de Sobolev das funções f definidas em todo espaço n dimensional com valores complexos tais que f está em L² e sua Transformada de Fourier (Ver Exercício 3) é tal que
É um espaço de Hilbert com o produto interno dado por
Ok, acabamos de enunciar alguns exemplos do que é um espaço de Hilbert, e talvez você tenha entendido a ideia do porquê é importante. Mas, para os mais atentos, ficou claro que não mencionamos explicitamente em momento algum o que é um espaço de Hilbert.
Portanto, para que os exemplos acima façam sentido, a definição de espaço de Hilbert deve ser a que você já deve imaginar: um espaço H é Hilbert (real) se ele é um espaço vetorial dotado de um produto interno ( , ) tal que este é um espaço de Banach com relação à norma induzida pelo produto interno (ou seja, se |u|² = (u,u) é uma norma que faz do espaço completo). No caso complexo, pediremos que o produto interno seja sesquilinear. A definição será devidamente esclarecida abaixo:
Definição: (a) Um produto interno num espaço vetorial V sobre R é uma função tal que
(i) (ii) para todos w,v em V (iii)
(b) Um produto interno (sesquilinear) num espaço vetorial V sobre C é uma função tal que
(i') (ii') (iii')
O produto no caso complexo é chamado de sesquilinear porque, da definição, este é linear na primeira entrada e conjugado-linear na segunda, ou seja, as somas saem, e a multiplicação por escalares se transforma na multiplicação pelo escalar conjugado.
Esclarecidas as definições, vamos para os primeiros resultados importantes sobre espaços de Hilbert:
Teorema 1: Dado K um convexo fechado num espaço de Hilbert (real) H, então, para cada f em H, existe um único u em K tal que
Tal elemento é caracterizado pela desigualdade de projeção:
Onde ( , ) é o produto interno de H.
Prova: Seja uma sequência tal que . Mostraremos que tal sequência é de Cauchy: Uma das mais importantes propriedades do produto interno é a identidade do paralelogramo: Se v,w estão em H, então
(Veja o Exercício 4). Assim, utilizando tal identidade com , e usando que está em K para todos m,n (pois K é convexo), então
Logo, existe um v que realiza a distância.
Para mostrar a unicidade, mostremos a equivalência entre u ser minimizante e u satisfazer a desigualdade de projeção.
1 - Se u satisfaz a desigualdade de projeção, então
Que mostra que u é minimizante.
2 - Se u é minimizante, então, como K é convexo,
Elevando ao quadrado, obtemos que
Para todo t real, que implica na propriedade desejada.
A unicidade é consequência da desigualdade da projeção, e será deixada como exercício (Ver Exercício 5).
Corolário 2: Se H é um espaço de Hilbert real, e M é um subespaço fechado de H, então, para cada f em H, existe uma única projeção em M, que é caracterizada por
Prova: Use a desigualdade da projeção com tv, onde t varia entre os reais.
Portanto, temos um análogo a espaços de dimensão finita para espaços de Hilbert. Mais adiante vamos utilizar este resultado de maneira mais direta quando estivermos falando de bases ortonormais.
A seguir, caracterizaremos o dual de um espaço de Hilbert H:
Teorema 3: (Representação de Riesz) Dado f elemento de H*, então existe um único v em H tal que
Prova: A unicidade é direta. Considere o subespaço . Se f não for 0, então M é um subespaço fechado estritamente contido em H. Mas então existe um g em H tal que
Definindo , então
Que completa a demonstração.
Com respeito a esse Teorema, podemos provar uma generalização muito importante utilizando este.
Teorema 4: (Lax-Milgram) Se é uma forma bilinear (ou seja, satisfaz a propriedade (i) nas condições para ser um produto interno, mas em cada entrada)
- Contínua: Existe C > 0 tal que |a(u,v)| ? C|u||v| para todos u,v em H
- Coerciva: Existe b > 0 tal que a(u,u) ? b |u|² para todo u em H
Então, para cada f em H*, existe um único u em H tal que f(v) = (u,v).
Prova: Vejamos que, para cada u em H, o funcional linear dado por u(v) = a(u,v), é contínuo. Logo, existe um único elemento Au de H tal que a(u,v) = (Au,v). Vemos, diretamente, que o operador linear A de H em H é contínuo, e |Au| ? b |u|. Portanto, A é injetivo.
Vejamos agora que A(H) é fechado: Se . Como |Au| ? b |u|, então
Portanto, para provar que A é um isomorfismo de H em H, basta ver que A(H) é denso em H, mas isto é fácil: Se (Au, v) = 0 para todo u em H, então b |v|² ? a(v,v) = (Av,v) = 0. Logo, v =0. Isto implica que A(H) é denso em H, que implica que A(H) = H.
Enfim, se f é elemento de H*, então seja w o elemento de H tal que f(v) = (w,v) para todo v em H. Assim, existe u em H tal que Au = w. Isto implica que f(v) = (Au,v)=a(u,v) para todo v em H, que é o que desejávamos.
Para uma generalização do Teorema de Lax-Milgram, o Teorema de Stampacchia, veja ([1], Teorema 5.6)
-Aplicações às Teorias de Equações Diferenciais Parciais-
Estes dois últimos teoremas são basicamente as ferramentas essenciais para se resolver EDP's elípticas de segunda ordem. Mais especificamente, Seja U um conjunto aberto, limitado, com bordo de classe C¹. Definimos então
Onde dizemos que existe no sentido fraco se satisfaz que
Para toda .
Proposição 5: é um espaço de Hilbert com o produto interno dado por
Prova: Seja uma sequência de Cauchy em H ¹. Então vemos que é de Cauchy em L². Logo, converge em L² para um limite u. Do mesmo modo, para cada i, temos que também é de Cauchy em L². Logo, para cada i, converge para . Vejamos que é a derivada fraca de na direção i:
Que vale para toda . Logo, u está em H ¹, e completamos a demonstração.
Como é evidente que , podemos considerar o fecho do primeiro espaço no segundo, e tal espaço será denotado por . Para relacionar este ultimo espaço com noções concretas, vejamos o próximo resultado:
Proposição 6: Existe um operador T linear e contínuo, definido em H¹(U) e com valores em , tal que, se , então
Mais ainda, temos que
Prova: Veja Teoremas 5.5.1 e 5.5.2 de [2].
Suponhamos então que tenhamos um operador definido por
Suponhamos que u seja uma solução do problema de Dirichlet
Queremos definir uma noção apropriada de solução fraca para tal equação. Então, usando a proposição acima, e multiplicando por uma , temos que, após integrar por partes (usando o Teorema de Gauss-Green)
Diremos, portanto, que u em H¹(U) é solução fraca do problema de Dirichlet se satisfizer a equação integral acima.
Suponhamos agora que L satisfaça a condição de Elipticidade Uniforme:
Para algum ? > 0. Considere portanto a forma bilinear B dada por
Transformamos o problema de encontrar uma solução fraca para tal EDP no problema de achar um u tal que para f em L² fixa temos que B[u,v] = (f,v), onde ( , ) denota o produto interno de L². Nesse momento que se torna interessante olhar para o teorema de Lax-Milgram, pois, talvez após alguns ajustes, devemos poder utilizá-lo, obtendo um teorema de existência e unicidade para soluções fracas de tal equação. Então, se existir uma solução clássica para tal problema (ou seja, se ), com Du em L², então esta deve ser única. Mais precisamente:
Teorema 7: (Primeiro Teorema de Existência e Unicidade) Existe um a ? 0 tal que, se d ? a, então o problema
Tem uma única solução fraca para cada f em L².
Prova: Chamaremos a seguinte forma bilinear de a-associada a B:
Se tivermos , então uma conta fácil nos diz que tal forma é contínua para todo a em R. Para a coercividade, veja que, da elipticidade uniforme,
Por outro lado,
Onde a desigualdade acima foi obtida usando a desigualdade de Cauchy-Schwartz, seguida da desigualdade entre as médias polarizada com um t adequado. Assim, pela Desigualdade de Poincaré (Veja [2], Teorema 5.6.3 ou Exercício 8 abaixo), se d ? K como na desigualdade acima, temos que a forma associada satisfaz as condições pro teorema de Lax-Milgram. Como cada f em L² pode ser vista como um funcional linear contínuo em H¹(U), então obtemos, pelo Teorema de Lax-Milgram, que existe um único u em L² tal que
B[u,v] + d (u,v) = (f,v)
Para toda v em . Logo, u é a única solução fraca de
Como queríamos demonstrar.
Na seção de exercícios, sugeriremos algumas outras aplicações do Teorema de Representação de Riesz e do Teorema de Lax-Milgram, bem como mais sobre espaços de Hilbert.
-Exercícios-
1. Prove que o espaço L², definido como no Exemplo 1 acima, é um espaço de Hilbert.
2. Prove que o espaço l²(N), definido como no Exemplo 2 acima, é um espaço de Hilbert.
3. Seja f em L¹ do espaço real n-dimensional. Definimos sua Transformada de Fourier como a função
(a) Mostre que a transformada de Fourier F definida em L¹ é tal que Ff é contínua, limitada e vai a zero no infinito.
(b) Se f está em L¹ e L², sabemos que a norma L² da sua transformada de Fourier é igual à sua norma L², ou seja,
(Veja [2], Teorema 4.3.1, por exemplo). Mostre que isso nos permite estender a transformada de Fourier de maneira única a L², onde esta é um isomorfismo isométrico.
(c) Prove que o espaço definido no Exemplo 3 acima é um Espaço de Hilbert.
4. Prove a identidade do paralelogramo: Se H é um espaço de Hilbert, v,w estão em H, então
(Dica: |u|² = (u,u))
5. Prove, com a desigualdade da projeção, que a projeção em um convexo K é única.
6. Seja mensurável. Prove que o conjunto
É convexo e fechado. Determine, de forma explícita, a projeção .
7. Dizemos que uma sequência num espaço de Banach B converge fracamente para um u se, para qualquer f elemento do dual de B, a sequência de reais
Escrevemos, então, .
Assim, considere H um espaço de Hilbert, e uma tal sequência com e Prove que
(Dica: Siga a dica do Exercício 4).
8. Seja U um conjunto aberto, limitado. Então, prove que existe C > 0 tal que, para toda u em H¹(U),
Obs.: Pode ser útil saber que C¹(U) é denso em H¹(U). Para uma prova deste resultado, veja [2], Teorema 5.3.2.
(Dica: Use o Teorema Fundamental do Cálculo)
9. Formule uma noção de solução fraca para o problema de Poisson com condições de bordo de Neumann:
Onde ? denota o vetor normal exterior no bordo de U. Prove que tal problema tem solução fraca única se e só se
10. Prove que as únicas soluções do problema de Poisson-Neumann homogêneo
São u = C constantes.
-Referências-
[1] - H. Brezis. Functional Analysis, Sobolev Spaces and Partial Differential Equations. Springer, 2011.
[2] - L.C. Evans. Partial Differential Equations (Second Edition). American Mathematical Society, 2010.
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